domingo, 28 de maio de 2017

Metafisica do sexo - EROS E AMOR SEXUAL - O preconceito evolucionista



É evidente que o significado que deve atribuir-se ao sexo depende não só do  modo como, em geral, se concebe a natureza humana, mas também da antropologia particular que se adota. O caráter desta antropologia não poderia deixar de refletir-se sobre o próprio conceito do sexo. Assim, o significado que pode apresentar a sexualidade, do ponto de vista duma antropologia que reconhece ao homem a dignidade dum ser não exclusivamente natural, será, por exemplo, necessariamente oposta àquele atribuído por uma antropologia que o considera como uma das numerosas espécies animais, numa época em que — como disse H. L. Philp  — pareceu conveniente escrever Seleção Natural com maiúsculas, tal como se fazia outrora com o nome de Deus.

O enquadramento da sexologia ressente-se, num período mais recente e até nos atuais tratados com pretensões «científicas», da herança do materialismo do século XIX, que teve por premissas o darwinismo e o biologismo, ou seja, uma imagem completamente deformada e mutilada do homem. Do mesmo modo que, segundo estas teorias, o homem teria derivado do animal por «evolução natural», também a sua vida sexual e erótica era exposta em termos de um prolongamento dos instintos animais, e explicada, no seu fundo último e positivo, pelas finalidades puramente biológicas da espécie.

Assim, afirmou-se também neste domínio a tendência moderna de reduzir o superior ao inferior, de explicar o superior pelo inferior — no caso presente, o  humano pelo fisiológico e animal.

Para os gostos mais delicados interveio em seguida a psicanálise, que fez entrar  em linha de conta o elemento psicológico, confirmando, porém, a mesma tendência. Com efeito, para a antropologia psicanalítica, o fundo do homem é sempre constituído por um elemento pré-pessoal e subpessoal — o 'mundo do inconsciente, do instinto, do «Es», dos arquétipos arcaicos que reconduzem a uma ancestralidade primitiva. É em função deste fundo ou subfundo que os psicanalistas pretendem explicar tudo o que no homem se tinha anteriormente considerado como vida psíquica autônoma: e, com mais força de razão, tudo quanto se refere ao amor e ao sexo.

As nossas premissas serão completamente diferentes. O ponto de partida não será a teoria moderna da evolução, mas sim a doutrina tradicional da involução. Para nós, e neste caso, não é o homem que descende do macaco por evolução, mas o   macaco

que descende do homem por involução. Como para um De Maistre, também para nós os povos selvagens não são povos primitivos, no sentido de povos originais, mas sim os restos degenerescentes, crepusculares, noturnos, de raças mais antigas, inteiramente desaparecidas. Tomaremos por certo aquilo que, de resto, pressentiram recentemente vários investigadores revoltados contra o dogma evolucionista (Kohlbrugge, Marconi, Dacqué, Westenhöfer, Adloff): mesmo nas espécies animais devem reconhecer-se as especializações degenerativas em que se esgotaram certas possibilidades inerentes ao ser humano primordial, isto é, os subprodutos do verdadeiro processo evolutivo, que desde o início se centralizou no homem. Contudo, a ontogênese — a história biológica do indivíduo — não é, de modo algum, a  repetição da filogênese — a presumível história evolutiva da espécie; ao contrário, percorre de novo as possibilidades eliminadas, detendo-se nos esboços, prosseguindo e subordinando estas possibilidades ao princípio superior e especificamente humano que, no desenvolvimento do indivíduo, se define e manifesta cada vez mais.

As diferenças fundamentais de métodos e horizontes que derivam destas  premissas recortam-se com clareza relativamente ao nosso problema. A sexualidade humana não será por nós considerada como um prolongamento da sexualidade  animal — tentaremos, ao contrário, explicar esta em si própria, nos animais e tal  como eventualmente se apresenta também no homem — como a queda e a  regressão dum impulso que não pertence a esfera biológica. Do ponto de vista metafísico, será assim que as coisas se nos irão deparar relativamente ao chamado «instinto de reprodução» e à própria «vida da espécie». Eles de forma alguma representam o fato principal, não passando de meros derivados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário